Política brasileira: a tragicomédia do egoísmo dos políticos

Às vezes, parece que a vida pública brasileira é um episódio infinito de uma série tragicômica, em que o protagonista é sempre o mesmo: o político brasileiro que, coitado, só consegue enxergar o próprio umbigo.

Você já viu esse personagem antes. Aliás, ele está em toda parte – nos discursos inflamados que são mais autopromoção do que soluções reais, nas redes sociais repletas de fotos bem calculadas e até naquela inauguração de parquinho que custou mais do que o PIB de uma cidadezinha do interior. Porque se tem uma coisa que o político brasileiro sabe fazer é transformar até uma obra de meio-fio em um megaevento que beira o espetáculo.

Um breve diagnóstico da doença umbiguista

Antes de prosseguirmos, vamos entender o fenômeno. O “político umbiguista” é aquele cuja visão política se limita a um raio de 30 centímetros – mais especificamente, ao espaço entre o peito estufado e a barriguinha cultivada em muitos almoços beneficentes. Ele não olha para o país, para o povo ou para o futuro. Ele olha para ele mesmo, sua imagem no espelho e, de vez em quando, para o nome em letras garrafais que ele mandou pintar em uma praca de concreto recém-entregue.

E aí vem a tragédia. Porque, enquanto o umbigo do político brilha, o resto do país desmorona – um poste caindo aqui, um buraco que não fecha lá. Mas o importante é que o político está feliz. Afinal, não importa se a cidade não tem esgoto; o importante é que ele apareceu no jornal local do domingo com um sorriso de mil dólares e uma pós-produção digna de filme de Hollywood.

Eu, o salvador da pátria (ou pelo menos da minha imagem)

É curioso notar como o umbiguismo é contagioso. Começa de mansinho. Primeiro, ele se apresenta como o “salvador” que vai revolucionar a cidade, o estado ou o país – depende de quão grande é o ego. Durante a campanha, ele aperta mãos, beija crianças e sorri para selfies como se fosse um velho amigo de todas as pessoas que cruza no caminho. Por trás desse teatro, claro, estão horas de treino no espelho, para acertar a sobrancelha levantada que transmite “preocupado, mas confiante”.

Quando eleito, vem o golpe fatal: ele não governa; ele performa. Cada reunião é uma chance para um bom clique. Cada obra inacabada, uma oportunidade de discurso. É o puro álibi da incompetência. Afinal, ele não precisa resolver os problemas; ele apenas precisa parecer que está trabalhando. Se o resultado é bom ou não, isso é detalhe.

Eu diria que a maior obra do político umbiguista é ele mesmo. Seu maior legado é a própria imagem, cuidadosamente preservada em outdoors, faixas, santinhos e, claro, posts patrocinados no Instagram com frases genéricas do tipo: “Juntos, construímos um futuro melhor”. A ironia? Não tem junto nem futuro; tem só ele, sorrindo, e um texto escrito pelo assessor de imprensa.

Político e o fenômeno das inaugurações (ou: como cortar uma fita sem construir nada)

Há algo fascinante sobre a relação do político brasileiro com inaugurações. Você pode pensar que a fita vermelha é um simples símbolo, mas para ele, é quase um rito religioso. Não importa que a obra esteja pela metade ou que o custo tenha triplicado – o importante é cortar a fita, dar um discurso emocionado e postar a foto com aquela legenda: “Mais uma conquista para o povo!”. O povo, claro, é sempre um personagem coadjuvante nessa história.

Recentemente, vi um caso clássico: um prefeito que inaugurou um hospital sem médicos, equipamentos ou pacientes. Um hospital cenográfico. Parecia piada, mas era verdade. E lá estava ele, no palco, com seu sorriso e aquele ar de quem merece um Oscar.

O Que acontece quando o político olha para o lado?

Agora, imagine uma realidade paralela em que por algum motivo inexplicável, o político umbiguista levanta a cabeça e olha para o lado. É um choque, quase como ver a luz depois de anos trancado em um quarto escuro. Ele veria, por exemplo, a falta de escolas de qualidade, hospitais sucateados, o transporte público colapsando e a população desamparada. Talvez ele também descobrisse que sua popularidade não é tão grande assim fora dos perfis fakes que comentam “Parabéns, líder!” em suas postagens.

Mas o problema de olhar para o lado é que isso exige um compromisso com a realidade. E convenhamos: a realidade não rende tantas curtidas.

Um final que não termina nunca

A tragédia do político que só olha para o próprio umbigo é que ele é uma síndrome, não um caso isolado. Ele é um produto de um sistema em que as aparências são mais importantes do que os fatos, e a responsabilidade é um conceito flexível – da mesma forma que o orçamento de uma obra pública.

Por isso, ele vai continuar lá, sorrindo em um palanque, prometendo o impossível e nos lembrando que, no fundo, o país precisa de uma coisa que ele não consegue oferecer: um governante que olhe para o mundo além do próprio reflexo.

Até lá, a gente segue vendo o político olhar para si mesmo, esperando que um dia, por algum milagre, ele perceba que governar é mais do que postar fotos e cortar fitas. Mas não prenda a respiração. Se depender do nosso protagonista, a fita é cortada, mas o problema não é resolvido.

É trágico. É cômico. E, pior ainda, é real.

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